terça-feira, 21 de setembro de 2010

Vuyazi, a princesa insubmissa

A lua está novamente cheia. Para além da óptima iluminação, que faz dela o melhor candeeiro das ruas de Vilankulo, contamos com a presença da Vuyazi, a mulher que foi estampada na lua e que tem consigo a trouxa à cabeça e o filho às costas.

Apresento-vos a história desta mulher que todos os meses aparece no céu de Moçambique: 

"Era uma vez uma princesa. Nasceu da nobreza mas tinha o coração de pobreza. Às mulheres sempre se impôs a obrigação de obedecer aos homens. É a natureza. Esta princesa desobedecia ao pai e ao marido e só fazia o que queria. Quando o marido repreendia ela respondia. Quando lhe espancava, retribuía. Quando cozinhava galinha, comia moelas e comia coxas, servia ao marido o que lhe apetecia. Quando a primeira filha fez um ano, o marido disse: vamos desmamar a menina, e fazer outro filho. Ela disse que não. Queria que a filha mamasse dois anos como os rapazes para que crescesse forte como ela. Recusava-se a servi-lo de joelhos e a aparar-lhe os pentelhos. O marido cansado da insubmissão, apelou à justiça do rei, pai dela. O rei, magoado, ordenou ao dragão para lhe dar um castigo. Num dia de trovão, o dragão levou-a para o céu e a estampou na lua, para dar um exemplo de castigo ao mundo inteiro. Quando a lua cresce e incha, há uma mulher que se vê no meio da lua, de trouxa à cabeça e bebé nas costas. É Vuyazi, a princesa insubmissa estampada na lua. É a Vuyazi, estátua de sal, petrificada no alto dos céus, num inferno de gelo. É por isso que as mulheres do mundo inteiro, uma vez por mês apodrecem o corpo em chagas e ficam impuras, choram lágrimas de sangue, castigadas pela insubmissão de Vuyazi."  

In Niketche, de Paulina Chiziane
 
                                                                         

2 comentários:

  1. É um livro incrível esse... Adorei!
    Beijinho

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  2. Ainda me lembro... Estavas a ler esse livro antes de partires...
    A vida é, de facto, insubmissa e em tudo ecoa já o anúncio do sangue novo.
    Por aqui há demasiados candeeiros, demasiada luz - nem sempre é possível a solidão límpida, onde se espelhe, em conto, o caminho que nos traz ao mundo.
    Porque o mundo é uma história contada...e que bonita que é contada por ti Filipa!

    Beijinho

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